domingo, 18 de março de 2012

O TRAPALHÃO

Por Armando de Oliveira Caldas
Ficção científica.

Vega é uma estrela quase três vezes maior que nosso Sol, quarenta e oito vezes mais brilhante. Com um diâmetro de três milhões de quilômetros cuja temperatura é de onze mil graus, quase o dobro da existente em nosso astro rei. Pode ser vista apenas de janeiro a abril no hemisfério norte. Localiza-se na constelação Lyra, onde também pode ser observado o “Ring Nebula”.
Referida estrela possui uma considerável família de planetas, grandes e pequenos, ao todo são vinte e três. Vários deles são rochosos igual a Terra. Os primeiros das órbitas internas são muito quentes, ou seja, até o quinto. No sexto a temperatura é bastante alta e alem de tudo enfrenta forte claridade, o mesmo acontecendo no sétimo, embora mais frio. No oitavo planeta, chamado Zunic, existe uma grande civilização que se estende por todo o sistema. Lá se encontra o grande Império Vega.
O Império Vega, devido a estabilidade de seu mundo desenvolveu-se tecnologicamente até o mais alto grau da ciência. Nenhum segredo cósmico existe para eles. Conhecem a Terra e possuem integrantes vivendo junto conosco. Difícil estabelecer diferenças físicas, razão de não terem sido notados.
Zunic leva três anos terrestres para circular Vega, havendo mínimas diferenças entre as estações, portanto constantemente possui um clima bom e agradável, exceto nas proximidades dos pólos e no equador. É do tamanho de nosso planeta, também com uma rotação de vinte e quatro horas. Um grande satélite natural fica na sua órbita, quase um planeta, sendo apenas três vezes menor do que seu parceiro. É repleto de construções e bases de lançamentos de naves. Possuindo atmosfera e relativa gravidade.
Em Zunic raramente acontecem terremotos, erupções vulcânicas, inundações ou outros fenômenos geológicos. Guerra entre as nações ficou na história, num passado remoto. Por outro lado, presídios existem para manutenção da ordem, sendo pouca a quantidade de pessoas cumprindo penas. Para casos considerados graves: prisão perpétua ou no mínimo o banimento do réu. As leis são as mesmas para todos os Países.
Os habitantes, como já foi observado, são iguais a nós com raras diferenças, também distribuídos em nações. Convivência pacífica e distribuição do trabalho dentro de uma democracia perfeita marcam o dia a dia da população.
Mas vamos a história.
Turibi, sua esposa Mira e o filho Juber, viviam na Capital de Riliax chamada Xava.
O rapaz desde criança era o que poderia ser chamado de desastrado. Muito desligado, vivia a aprontar das suas. No bairro em que nascera e se criara conheciam-no bem. Quando o viam chegar, tiravam objetos que poderiam ser quebrados, mas gostavam dele por ser muito gentil.
Apesar de seu modo de ser enamorou-se de Mira e seu casamento foi um bom acontecimento no local. De emprego em emprego, acabou por se firmar no serviço de limpeza do Centro de Projetos Espaciais da Nação. Habituou com a atividade que exercia e assim o tempo passou. Após o nascimento do filho, Mira conseguiu trabalho numa escola de controle infanto-juvenil, da qual Juber viria a ser aluno.
Tudo era rotina até que certo dia a vida da família mudaria completamente.
A visita do Presidente ao Centro de Projetos movimentava o grande estabelecimento. Um dia de festas. Uma grande comitiva e convidados entraram nas instalações.
Turibi estava nervoso com tudo aquilo. Nunca estivera frente a grandes autoridades e sentia-se inibido. Como os demais companheiros, mantinha sua roupa especial, maleta nas costas e um tipo de sugador que indicava lugares que deviam ser limpos. O volume de pessoas acabou levando-o para o setor onde uma grande experiência seria realizada. Chega para lá, chega para cá e acabou por ficar próximo às mesas de controles.
Lamarcan era um governador muito bem quisto, sério, sisudo com aparência de cinqüenta anos. Havia visitado várias partes do complexo e naquele momento, junto com seguranças e políticos, subiu na plataforma de teletransportes para grandes distâncias na finalidade de cumprimentar os homens que seriam cobaias.
Foi quando tudo aconteceu, os escolhidos que realmente seriam transportados vestiam grossas roupas, encapuzados, como para agüentar um frio muito forte. Com a indumentária que estavam, logo que foram chamados, se dirigiram para o local, mas o primeiro ao passar próximo a Turibi fez com que ele se afastasse. Ao fazer isto, perdeu o equilíbrio e para não cair apoiou-se justamente na mesa de comando, fazendo acionar o processo eletrônico.
--- Cadê o Presidente e os demais que estavam juntos?
--- O Presidente sumiu!!!
--- Quem foi que fez isto?
Não demorou em descobrirem o autor, imediatamente preso.
Turibi estava atônito, não fizera por querer.
Não houve perda de tempo, uma força tarefa foi enviada rapidamente para o décimo primeiro planeta, para resgatar o Presidente e os demais. O grupo indevidamente teletransportado não possuía qualquer equipamento para o levantamento das coordenadas, o que impedia um retorno imediato. Também não dispunham de roupas apropriadas para enfrentarem o gélido ambiente.
Depois de algumas horas as autoridades e seguranças estavam de volta, tiritando de frio. Ocorreu uma debandada dos visitantes e a notícia espalhou-se, ninguém perdoava o autor da quase tragédia.
Mira ficou sabendo, desesperada procurava notícias do esposo. Estava trancafiado, incomunicável e nada do que fez possibilitou chegar perto dele.
As explicações de Turibi de nada adiantaram, embora o próprio homem que esbarrou nele de certa forma o inocentasse.
Com muito custo a esposa conseguiu falar com o marido e disse-lhe que sempre estaria ao seu lado.
Algum tempo depois houve o julgamento, muito rápido, foi considerado culpado. Teve como atenuante sua vida cheia de trapalhadas, o que lhe foi até benéfico. Ao invés de mofar numa prisão, sua pena foi a de ser banido do planeta.
Mira não se conformava, tomou coragem e procurou o próprio Lamarcan, que apesar de seu cargo a recebeu. Pediu que ele o perdoasse, mas não encontrou apoio e sua resposta foi:
--- Entendo você, mas saiba que quase morri, bem como todos os que estavam comigo. Não posso fazer isto, estaria contrariando nossas leis.
Vendo que nada conseguia, disse:
--- Já que não pode livrá-lo da pena, então deixe que eu vá junto.
--- Uma coisa é possível ser feita. Vou solicitar para que seja enviado para um mundo quase igual ao nosso, com todo apoio que possa lhe ser dado. E se ainda quiser poderá acompanhá-lo.
--- Levarei meu filho também.
--- Tudo bem Mira. Vou autorizá-la.
Na Central da Justiça a carta do Presidente foi recebida e a partir de então uma especial atenção foi dada ao prisioneiro. Imediatamente foi enviado para o Setor Aeroespacial.
Mira e Juber foram convidados a participarem da triagem.
Estudado o tipo físico da família e colocado no sistema, a indicação foi que deveriam ser trazidos para a Terra, mais claramente para o Brasil e ainda mais especificamente para Belo Horizonte onde existia um agente Vega.
Definido o destino, os três foram transferidos para um centro de treinamento, onde o português foi inserido em seus cérebros com algum conhecimento do local para onde iriam.
Cerca de um mês depois foram considerados prontos, embora com algumas restrições a Turibi.
Nas vésperas da viagem, o jovem recebeu uma caixa para ser entregue a Jean Carlos Rodrigues o contato na cidade mencionada. Depois disto foram acompanhados até o local onde residiam para pegarem algumas coisas que quisessem levar. Objetos pessoais que não provocassem desconfianças no povo da Terra.
Quando entrou, Turibi colocou a caixa que recebera sobre uma mesa. Em seguida, junto com Mira foram buscar alguns pertences que consideravam importantes para ambos. Enquanto isto, Juber mesmo sabendo que não deveria levar, colocou debaixo da camisa um brinquedo que usava para flutuar.
Acompanhados da escolta voltaram para o local do treinamento onde um grupo especial já os esperava. Em seguida foram para a astronave que já estava pronta. Oficiais da Justiça registraram a entrada deles no objeto e deram por cumprida a sentença.
Acomodados em confortáveis poltronas, a partida foi instantânea.
Estavam já em pleno espaço quando Turibi, desesperado disse para Mira:
--- Esqueci a caixa!
--- Você esqueceu, mas eu não, ela está do meu lado.
Foi um alívio para o jovem.
Cerca de um mês após, o comandante veio lhes comunicar:
--- A Terra está próxima, em poucos minutos estarão no local determinado. Aprontem-se e venham comigo.
O pequeno grupo tomou suas bagagens e o acompanhou. Em seguida mandou que entrassem num compartimento cilíndrico e fechou a porta.
Tudo brilhou. Instantes depois estavam numa rua de pouco movimento. Era noite, não sabiam o que fazer, mas logo um homem se aproximou deles e lhes disse:
--- Venham comigo.
O casal e o garoto seguiram o estranho que não demorou a chegar numa residência um pouco afastada.
Entraram na casa e o homem falou na linguagem de Zunic:
--- Sejam bem vindos. Esta será a primeira e última vez que falaremos em nossa língua. Em seguida disse em português:
Sou Jean Carlos Rodrigues, vocês devem ter trazido alguma coisa para mim.
--- Sim, trouxemos esta caixa, por sinal, muito pesada. Disse Turibi na língua natal, embora tivesse entendido o que Jean lhe havia dito.
--- Turibi, não fale nosso idioma. Você se complicará e se isto acontecer serei obrigado a dizer que não o conheço. Cuidado!
Mira falando em português completou:
--- Pode deixar Jean, tomo conta dele.
--- Eu também. Salientou Juber.
--- Bem, então estamos entendidos. Agora vão descansar, amanhã teremos de providenciar muitas coisas.
--- Vou tomar cuidado com a língua. Se não for inoportuno gostaria de saber o que contem a caixa. Observou Turibi.
Jean abriu a mesma, verificou o conteúdo e disse:
--- Contem o necessário para sobreviverem e documentos me orientando.
--- Necessário para nossa sobrevivência? Inquiriu Mira.
--- Ouro e pedras preciosas Mira, muito comuns em nosso planeta, mas raro aqui. Agora devem dormir, no segundo andar tem um apartamento onde poderão ficar temporariamente até se adaptarem.
Boa noite!
Em seguida subiram as escadas e entraram no espaçoso cômodo.
--- O que será isto? Perguntou o rapaz mostrando a TV.
--- Não sei, amanhã perguntaremos. Não vá mexer!
Mas foi o mesmo que falar para ele fuçar. Não demorou e Turibi estava ligando e mexendo no aparelho. Em cima do mesmo havia um objeto de adorno, esbarrou nele e o mesmo caiu sobre seu pé.
--- Cachimbim tata!!! Gritou.
--- Pai não xingue na nossa língua. O senhor não tem jeito mesmo. Disse-lhe o garoto censurando-o.
--- Dá um jeito de desligar isto e venha dormir, estou muito cansada. Reclamou Mira.
Não demorou e os três se acomodaram.
Quando acordaram de manhã, o sol já brilhava com intensidade. Jean veio até a porta do apartamento e com muito custo conseguiu que levantassem.
Na mesa para o café, apresentou-lhes sua esposa Olívia, que também era de Vega. A serviçal fora bem remunerada e dispensada logo que aprontou uma farta alimentação para os convidados. Assim, poderiam ensinar com tranqüilidade a recém-chegada família.
Estavam com muita fome, mas aquelas coisas que viam não se pareciam nada com os alimentos de seu planeta. Mas isto vinha em segundo plano. Turibi não esperou nenhuma explicação, logo foi pegando um pedaço de melancia e tentando comê-la com a casca.
--- Como isto é duro!
--- Também você nem esperou que ensinássemos. Isto é melancia e comemos apenas a parte vermelha.
Em seguida foi a vez dele pegar uma fatia de presunto. Comeu e gostou, perguntando:
--- O que é isto? É muito bom!
--- É feito com carne.
--- Carne? Aqui se come carne? Perguntou com jeito de estar passando mal do estomago.
--- Ora Turibi é carne de animais. Você não espera que mostremos cada tipo de alimento, vai logo pegando e comendo. Façamos uma coisa, não pegue nada antes de nos perguntar.
Até o garoto se comportou corretamente e entendeu a orientação.
Foi um dia difícil para o casal anfitrião.
Enquanto aquela família não aprendesse o novo ritmo de vida, Olívia estaria sozinha, com todos os afazeres da casa.
Mira compreendeu a situação e passou a ajudá-la, até mesmo Turibi e o menino.
Depois de um mês, a experiência passou a ser na rua. A princípio sempre acompanhados do casal. Assim, mais um mês e já sabiam se locomover dentro da Capital de Minas.
Mira até já havia aprendido a ir a supermercados. Numa das compras levou Juber, que como qualquer garoto de oito anos, era arteiro. O menino, escondendo da mãe, levou seu brinquedo preferido: o trufi, ou seja, o cinto que permitia a flutuação.
Enquanto ela procurava o artigo que Olívia pedira, o garoto bisbilhotava outras coisas. Curioso por algo que vira na ultima prateleira, acionou seu equipamento. Com isto se elevou. Uma velha senhora viu aquilo e quase sem voz apontava para ele dizendo com dificuldade:
--- Olha o menino!
Mira voltou-se e viu o filho. Correu, o segurou pelas pernas e o trouxe para baixo, ao mesmo tempo apertava sua orelha.
A idosa mulher viu tudo e colocou a boca no trombone:
--- Eu vi! Eu vi!
--- Viu o que senhora? Perguntou uma atendente do estabelecimento.
--- O menino estava lá em cima!
--- Lá em cima como? Ele subiu na prateleira?
--- Não, ele voou!!!!
Enquanto isto Mira já havia saído e continuava repreendendo o filho.
A idosa mulher fez um escândalo tão grande que até a segurança foi chamada. Somente ela havia visto a criança. No final o fato foi dado como um delírio de idade, mas o caso chegou a ser divulgado pela televisão.
Juber chegou muito sem graça no apartamento e até Olívia o repreendeu. Tomaram o cinto dele e esconderam para que não voltasse a fazer mais aquilo.
O tempo continuou passando e certo dia Jean chamou os três para uma reunião.
--- Espero que já aprenderam a viver neste mundo, portanto chegou o momento de tratarmos da identificação de vocês.
Turíbio, seu nome a partir de agora será: Alencar Moura.
Você Mira, Marta Alves Moura e o garoto José Elias Moura.
Para todos os efeitos nasceram em Lajeado, Estado do Rio de Janeiro e não possuem parentes vivos.
Todos os documentos já estão prontos. Nunca poderão dizer que vieram de outro planeta, seria uma desgraça para vocês. Começando por caírem no ridículo, portanto não se esqueçam disto.
Estou negociando uma casa para vocês perto daqui. Hoje aprenderão a desenhar seus nomes e amanhã assinarão toda a papelada de identificação. É importante confirmarem que perderam os originais se perguntarem. Quando tudo estiver certo fecho o negócio da casa e daí em diante passarão a ter vida própria.
Enquanto Jean os orientava, fogos de artifícios explodiam na redondeza. Turibi assustou-se com o que ouvia e logo perguntou:
--- O que está acontecendo?
--- É uma festa junina. Soltam rojões para comemorarem. Respondeu o representante de Vega.
Em seguida continuou a mostrar-lhes uma série de postura que deveriam ter.
Algumas semanas depois, Turibi e Mira estavam se habituando a saírem juntos e passearem. Numa dessas andanças o casal se distanciou do centro. Despreocupados, não sabendo ainda o perigo que corriam, recordavam momentos felizes que passaram em Xava. Assim, escureceu e um bonito céu estrelado parecia cobri-los.
--- Como é diferente o firmamento aqui, a lua é menor e falta o círculo da “nebula”, mas é belo da mesma forma. Observou a esposa com nostalgia.
--- Tem razão querida. Faz tempo que quero lhe pedir perdão por todas as minhas trapalhadas. Estaríamos em nosso mundo se não fosse por minha causa.
--- Não vamos falar disto, o importante é que meu amor por você é muito grande.
Estavam nesse colóquio, quando carros da polícia e tiros perturbaram aquele tranqüilo momento. Turibi logo se entusiasmou e disse:
--- É festa Mira! Vamos ver como é! E andou na direção do barulho das metralhadoras.
--- Pare Turibi! Vamos voltar, há pessoas correndo. Não sei explicar, mas deve ser guerra.
--- É festa Mira! Nisto uma saraivada de balas atingiu um muro próximo deles.
Foi necessário quase ser atingido para que ele entendesse. Saíram então correndo e chegaram esbaforidos onde estavam morando.
Contaram para Jean e Olívia e foi ela quem advertiu:
--- Não podem ir para qualquer lugar, aqui ainda existe muita ignorância e vai demorar em agirem como nosso povo. Poderiam ser mortos ou seqüestrados, mas no fundo foi bom, pelo menos aprenderam o que é o perigo.
O fato serviu para colocar um pouco a cabeça de Turibi no lugar. A partir daquele dia passou a ouvir com maior atenção os conselhos do casal que o acolhia. Assim mesmo, vez ou outra não deixava de dar seus foras. Acabou danificando a TV, liquidificador e alguns outros objetos. Contudo não era burro, entendia bem sua situação. Mira e Juber estavam sempre de olho nele, mas o amavam.
A casa foi comprada, mudaram para ela e Olívia voltou à sua rotina contratando novamente uma serviçal.
Turibi já entendia bem o que era o dinheiro, sabia ser rico e que poderia usufruir uma vida que nunca teria no seu mundo, mesmo assim, era um trabalhador e não queria ficar ocioso. Falou sobre o assunto com Jean:
--- Preciso de algo para fazer.
--- Você terá uma ocupação, trabalhará comigo. Observou o amigo.
--- Afinal o que você faz, até hoje não percebi?
--- Venha comigo que lhe mostro, mas desde já lhe informo, o que irá ver é segredo. Nunca em nenhuma hipótese deverá ser revelado.
Jean seguindo a frente foi para seu quarto, nele apertou um botão na parede e ela se abriu.Algumas mesas, arquivos e um esquisito equipamento compunham o ambiente.
--- É neste lugar que exerço minha função. Aquela máquina ali está sempre ligada, veio de lá. Recebo imagens, informações e transmito mensagens para naves de nosso planeta quando se aproximam da Terra.
--- Então não estamos sozinhos.
--- Estamos, elas nunca descem aqui, somente num caso raro como o seu. No entanto, meu trabalho consiste no envio de informações que achar conveniente.
--- Que tipo de informação?
--- Ora Turibi, visitas de astronaves de outras civilizações são freqüentes e todas ficam registradas, tanto as que pertencem ao grupamento de que fazemos parte quanto a outras. Algumas até chegam a seqüestrar habitantes deste mundo para experiências genéticas.
--- Que absurdo!
--- Pois é, tenho que passar periodicamente os dados que consigo.
--- Só isto Jean?
--- Não. Os cientistas daqui evoluíram muito e rapidamente. Muitas vezes fazem experiências muito perigosas e aí estará em parte o seu trabalho.
--- Vou lhe ensinar. Sua função será a de colher toda e qualquer informação que puder, seja através de jornais, Internet ou de outros meios de comunicação que existem. Também será um agente secreto como eu.
--- Eu, Agente Secreto? Que maravilha!
--- Tenho até medo. Não quero nenhuma trapalhada, isto é muito sério.
Embora Turibi fosse bastante avoado se integrou bem na sociedade. Fazia amigos com facilidade, não demorou em que ficasse conhecido no bairro onde residia. Acabou percebendo que na Terra a vida corria igual ao seu mundo e como lá, passou a ser recebido pelas pessoas. Dar foras era com ele, mas isto apenas causava risos e ninguém levava a sério certas coisas que dizia. Apenas achavam que lhe faltavam alguns parafusos. Acabou mantendo seu nome, dizia ser apelido que recebera. Para se ter uma idéia de suas trapalhadas, certo dia foi convidado por Altair, seu vizinho para um churrasco em sua casa.
Turibi junto com Mira e o filho que fazia questão de ser chamado por José Elias foram passar uma tarde com a família. Conversa vai, conversa vem, Turibi deglutia a carne e abusava das bebidas. Mira o cutucava, mas ele não entendia e continuava e o efeito do álcool foi aparecendo. De repente falando com moleza começou:
--- Carrashi itubi trevor ... Isto é, a falar na linguagem de seu planeta.
Todos ficaram ouvindo os estranhos sons, sem sentido. Mira não perdeu tempo, explicou que ele não podia beber muito e que quando isto ocorria passava a dizer coisas sem nexo. Segurando o marido pediu licença e saiu do local, só ficou o garoto que encontrara amiguinhos e brincava.
Em casa, logo que melhorou recebeu um sermão da esposa.
No dia seguinte Altair encontrou com ele e brincou:
--- Como é que se fala mesmo Turibi? Carrashi...! E deu risada.
--- Desculpe-me Altair, às vezes isto me acontece. Disse um tanto envergonhado.
--- Que nada, são bons vizinhos e gostamos de vocês. Tudo é festa!
Logo o rapaz esqueceu do acontecimento e voltou a pensar no emprego que lhe seria dado por Jean. Uma idéia veio-lhe na cabeça:
--- Tenho a Internet, já sei como usar o computador. Começarei meu trabalho desde já.
Assim, logo que chegou em sua casa foi levantar dados. Colocou na busca “extraterrestres” e uma infinidade de sites apareceu. Entusiasmou-se com as coisas que via e lia e começou a tirar cópias de tudo. Assinalou, marcou, organizou as folhas. Passou numa locadora pegou o filme “Guerra nas Estrelas” e vários outros.
Mira vendo ele com tudo aquilo, perguntou:
--- O que vai fazer com isto?
--- Vou levar para Jean. É o trabalho que devo fazer.
Não entendeu bem o que o marido queria dizer e não deu importância.
Turibi colocou tudo numa sacola e foi para a casa do amigo.
--- Olha Jean, adiantei o serviço, veja o que trouxe.
O alienígena não se conformava com o que via e lhe disse:
--- Não é isto Turibi! Para não dizer que cem por cento de tudo que levantou é especulação ou fantasia, direi que apenas um por cento talvez tenha alguma coisa que sirva. Espere, vou lhe ensinar, não se precipite. De qualquer forma vai servir para mostrar-lhe o que realmente deverá procurar.
Por exemplo, pode devolver todos estes filmes, tudo é pura ficção, não vamos perder tempo com isto.
Em seguida pegava cada uma das folhas mostrava-lhe rapidamente sua inutilidade e a jogava fora. De tudo apenas reservou três delas. Havia fotos reais de objetos não identificados e uma declaração de uma autoridade idônea.
--- Só isto Jean?
--- Para você ver Turibi, o restante não existe. Seja como for você marcou um ponto, o que encontrou ainda não informei.
--- Mas estes sites! Parecem tão sem sentido. Os copiei apenas por copiar, não vi neles nada de interessante.
--- Pois é, será achando tais tipos de comentários que fará seu trabalho. Mais uma coisa, você não executará isto na sua casa e sim no escritório. Não pense que ficará apenas sentado, terá muitas vezes de procurar comprovação. Não fará por enquanto nada que não lhe peça ou explique como fazer.
Quando voltou para casa encontrou o filho muito triste e abatido resmungando e com um pequeno corte no rosto. Logo lhe perguntou:
--- O que aconteceu José Elias?
--- Ora pai. Na escola colocaram-me apelidos, ET e cabeça de alfinete. Briguei, dei, mas acabei também levando. A culpa é sua.
--- A culpa é minha?
--- É sim, quem manda ficar falando na nossa língua?
--- Mas quando foi isto?
--- Naquele dia na casa do Juca.
--- Casa do Juca?
--- No dia do churrasco aí em frente. O Juca contou para a turma.
--- Mas eu expliquei ao Altair e sua mãe também. Mas o que tem a haver cabeça e alfinete com isto?
--- Cabeça de alfinete eu não importo, mas não gosto que me chamem de ET.
--- Não ligue para isto, brinque com eles também. Já estou aprendendo a viver aqui, não é diferente de nosso lugar. Prometo que fato daquele tipo não vai mais ocorrer.
Nisto Mira chegou e ficou sabendo do acontecido. Fez um pequeno curativo na cabeça do menino e depois lhe disse:
--- Os seus colegas de hoje serão seus amigos e você deve esquecer que veio de um outro mundo. A partir de agora não é mais um ET e não vejo sua cabeça igual a de um alfinete, é apenas um pouquinho pontuda, como a minha e a de seu pai. Na cidade já vi tantos iguais a nós, que isto não faz nenhuma diferença.
--- Está bem mãe, mas o pai que pare de falar em nossa língua. Canso de dizer para ele não xingar em nosso idioma, se ele quiser ensino uns termos que aprendi.
--- Está vendo Turibi? Já faz quase um ano que estamos vivendo aqui e ainda temos alguns problemas por sua causa.
--- Que coisa! Não posso ter liberdade! Cachimbim tata de vida.
--- Turibi! Turibi! Será o possível?
Não respondeu, saiu vermelho como uma pimenta, mas logo voltou:
--- José Elias me ensine alguns termos. Às vezes preciso desabafar.
--- Está bem pai. Por exemplo: pode usar ...xx..xx...., entendeu?

Três anos após, ninguém seria capaz de dizer que aquela família não era terrestre. Turibi adotara seu nome Alencar e dominava integralmente o trabalho que executava. Jean acabou conseguindo que ele ficasse em seu lugar pedindo para retornar ao seu planeta. Na despedida Olívia chorou, parecia não querer voltar, mas não possuíam nenhum vínculo que os prendessem.
Alencar Moura passou então a ser Agente de Vega no Brasil. Jean lhe deixou uma fortuna em ouro e pedras preciosas devidamente documentadas. Para todos os efeitos na sociedade era apenas um homem de negócios bem sucedido.