A VOLTA
Depois de um ano no mundo
dos terrestres, Corin já se comunicava perfeitamente com os humanos. Regis
então o chamou e disse:
— Agora que já faz algum
tempo que está entre nós, você compreende que viemos de muito longe. Entende
que seu mundo é uma bola igual a muitas outras. Percebe que seu povo precisa
aprender muito para se desenvolver.
Você gostaria de saber mais,
muito além do que imagina?
— Gostaria sim Regis.
— Bem, então vamos levá-lo
para seu povo. Depois de um mês voltaremos para buscá-lo no mesmo lugar da
primeira vez, lembre-se que ninguém poderá chegar perto do transportador. Você
teve muita sorte por estar vivo.
— Regis, posso trazer Silas
comigo?
— Quem é Silas, sua
namorada?
Corin acenou afirmativamente
com a cabeça. O Chefe da Central então respondeu:
— Está bem, você poderá até
ajudá-la a se instruir.
Lembre-se, ainda aprendeu
muito pouco, poderá vir a ser igual a qualquer um de nós, o que será de
importância fundamental para sua nação.
Escrevemos uma longa carta
para ser entregue ao seu Rei. Uma grande quantidade de sementes para plantio
também seguirá. Dentro de algum tempo não haverá mais fome nas aldeias.
Qual não foi a surpresa dos
aldeões ao ver Corin transitar como antes entre eles. Olhavam assustados para o
moço, que calmamente se dirigia aos portões do Forte.
O interessante era que Tropo
já o esperava, simplesmente pediu a Jasun:
— Traga Corin a minha
presença. Sabia que ia voltar.
Mais amigo que servidor,
Jasun foi até o portão e subiu as escadarias acompanhando o jovem.
Corin se apresentou e
entregou um grande envelope ao Rei, este abrindo retirou um bloco de folhas
considerável, tornando a recolocá-las. Dirigindo-se para o moço, disse:
— Você vai voltar, não estou
certo?
— Dentro de um mês
Majestade.
— Tem alguma coisa a me
dizer?
— Sim. No alto da Serra tem
sementes, pediram que as plante. Darão frutos que eliminarão a fome de nosso
povo.
— Você sabe o que está
escrito nestas folhas?
— Não Majestade.
— Um dia antes de seguir
viagem, venha buscar minha mensagem.
Depois de conversar com o
Rei, Corin foi para a casa de Silas. Esta soubera que ele se encontrava na vila
desde a aurora. Estava raivosa, não queria nem olhar para o moço. Sentia-se
desprezada.
— Silas, voltei!
Ao contrário do que
esperava, utensílios domésticos começaram a chover sobre ele.
— Mas Silas, para que fazer
isto, eu amo você!
— Não vem com conversa, faz
muito tempo que me deixou, sem nenhuma explicação!
Chorei muito, pensando que
estava morto.
Está vivendo com alguma
outra e ainda quer que entenda?
— Não é nada disso. Preciso
que você se acalme para tentar lhe explicar. Vou lhe contar tudo.
Levou dois dias para Silas
se conter e escutar o namorado. E para entender? Isto ele não conseguiu, mas
prometeu que a levaria. Ao dizer que iriam juntos, encontrara a chave do
impasse. Para confirmar, Corin perguntou-lhe:
— Silas, já lhe expliquei
várias vezes onde estive e que vou voltar. Preste a atenção, volto a lhe
perguntar, você irá mesmo comigo?
— Vou! Não importa para
onde.
— Então terei que lhe
ensinar algumas coisas.
A moça era órfã de pai,
morrera na guerra. Estava decidida a partir com Corin, falou com a mãe. Esta
chorou, mas não podia impedir a filha, disse então que ia viver com a irmã na
aldeia vizinha.
Onde chegava, os curiosos o
rodeavam, queriam saber se estivera mesmo no mundo dos espíritos. Ele negava e
dizia que havia morado em outro mundo. Alguns acreditavam, outros achavam que
era brincadeira.
As semanas passaram, na
véspera do dia marcado Corin foi falar com Tropo, este lhe deu uma carta e um
grosso livro para levar.
Avisou Silas que partiriam
de madrugada e que não avisasse ninguém. Durante aquele mês procurou preparar a
moça, mas não lhe dava muita atenção, no fundo não acreditava no rapaz.
A escuridão era total quando
Corin, munido de um archote, bateu na porta e chamou:
— Silas, vamos! Não temos
muito tempo.
Como a maioria das mulheres,
não estava totalmente pronta, de qualquer forma apareceu logo, puxando uma
grande mala.
— Para que isto? Não vai ser
preciso, lá tem de tudo.
— Não vou sem ela!, afirmou
taxativa a moça.
— Está bem Silas! Então vou
ter de ir a pé, o animal não vai aguentar.
Puxando os dois quadrúpedes,
em um deles colocou o pesado caixote e no outro a namorada. A mãe abençoou o
casal e eles atravessaram as tortas ruas do povoado, tomando o rumo da serra.
Duas horas depois, estavam
subindo a trilha que dava para o alto da montanha, foi quando Silas exclamou:
— Então é verdade! Você não
estava mentindo!
— Prova que você me conhece
muito pouco, nunca iria mentir para você. Agora se quiser voltar, terá de fazer
sozinha, logo eles chegarão e preciso estar lá.
A jovem não respondeu, além
do frio da noite, outro lhe correu pela espinha.
Corin estava cansado, mas
logo estariam no topo. Com o archote e ainda lembrando do tempo que era
mensageiro, seguia com segurança o caminho.
Chegando ao cume, desceu a namorada
e a pesada mala. Retirou os arreios dos animais e os soltou. Em seguida
providenciou uma fogueira para rebater o ar gelado.
Silas estava pálida, seu
belo rosto moreno parecia totalmente branco. Embutida na grossa vestimenta
ainda tiritava de frio e medo. Corin puxou-a para si e procurou acalmá-la.
— Veja aquele ponto
luminoso, são eles.
A moça olhava assustada e
nada dizia, apenas se segurava no namorado. Estava apavorada, mais ainda quando
a nave aterrissou. Com os olhos arregalados, via as fortes luzes. Não desmaiou
porque Corin a avisara. O medo que sentia era tanto que lhe impedia andar.
Acabou sendo carregada para o transportador junto com o precioso baú.
— Silas, abra os olhos, está
tudo bem!
— Não está não! Não sei se
estou para cima ou para baixo. Estou com medo. Balbuciou a moça.
— É assim mesmo, logo
chegaremos e tudo voltará ao normal.
Apesar de tudo, até chegarem
a base ela até se recuperou, confiando no namorado. O problema foi na hora de
tirarem sua roupa para a descontaminação.
— É preciso Silas.
— Ninguém me toca! Não
deixo! Esquecera até que estava flutuando.
Foi preciso tempo para
convencê-la. Por fim aceitou, mostraram onde devia entrar e, sem ninguém perto
dela se desfez das várias peças que ficaram suspensas. Quando saiu vestia a túnica
que lhe deram. Passou pelo mesmo processo que Corin havia experimentado, com
uma diferença, o namorado estava sempre perto e a orientava em todos os
momentos.
Corin levou a carta e o
grande livro para Regis.
Tomando conhecimento do
conteúdo da correspondência, o chefe da Central convocou os principais membros
e pediu a presença do comandante.
— Senhores, li a mensagem de
Tropo. É extremamente surpreendente o que nos diz. Quero que cada um tome
conhecimento, passando inicialmente o documento para Marcos.
O comandante, de posse do
papel, pediu a Jansen que o traduzisse e fizesse a leitura em voz alta. Antes
porém, Regis alertou que o assunto deveria ser comentado somente entre os
presentes, assim, examinou o ambiente e pediu o fechamento das portas.
Ficaram boquiabertos diante
do conteúdo. O Padre Santos foi o primeiro a comentar:
— Estamos diante de algo que
nos parece impossível, lógico para nós simples mortais. Pelo que vimos, nossa
missão apenas está começando. O livro que nos enviou deverá confirmar o que nos
diz.
Todos concordaram com o
Padre. O assunto era delicado, assim, resolveram pela não divulgação.
Terminado a conversa, o
Comandante Marcos, aproveitando a reunião, disse:
— Desde que chegamos a este
planeta, tenho deixado o trabalho de aproximação para vocês. Quero que
entendam, se a descida na superfície não envolvessem situações como as que
apareceram, nós já estaríamos lá, sem nenhum auxílio. Minha capacidade é
técnica e, sinceramente nunca me dediquei a problemas diferentes. Pouco poderia
resolver no rumo que está tomando nossa fixação. Se concordarem, vou redigir um
documento oficial dando livres poderes a Regis para assumir um comando
paralelo. Dessa forma, me sentiria melhor, cuidaria apenas tecnicamente do
navio.
A anuência foi geral. Conforme
vinha acontecendo, tornava-se difícil o trabalho. A Central muitas vezes ficava
inibida em cada atitude que ia tomar, sempre precisando da autorização do
comandante. Este por sua vez parecia totalmente leigo nos assuntos, fora então
o melhor caminho.
Após alguns meses, Silas
sentia-se feliz, nunca imaginara nem em sonho, viver da forma que estava. Muito
ativa e ainda auxiliada por Corin, já começava a falar a linguagem dos
terrestres. A presença dos dois na cidade já não era nenhuma novidade, mais ainda,
eram bem quistos. Eles por sua vez, não mais estranhavam aquele povo sem pelos.
Conversaram com o Padre
Santos, se casaram e ganharam uma das residências. O trabalho deles era o
estudo, todos os dias recebiam aulas. O plano da Central: qualificá-los para
professores. Logo que estivessem prontos, grupos da superfície receberiam
ensinamentos. A pretensão era levar conhecimentos aquele povo primitivo.
No castelo, Tropo passou
tempo lendo e analisando as várias folhas que recebera dos Terráqueos. Não havia
mais dúvidas, como já sabia, eles haviam chegado. O momento das decisões se
iniciavam, fora o escolhido. Então que assim fosse. Chamou a esposa:
— Vina, o que esperava vai
acontecer. Vamos passar por períodos de muita fartura, por alguns anos tudo
correrá bem. Vamos receber muita ajuda.
— De quem, de onde?
— Do alto, do céu. Corin foi
o mensageiro, já distribui as sementes e orientei como plantá-las. Aqui nestes
papéis está tudo explicado. Jasun está acompanhando nosso povo. Quando a
colheita for feita, vamos ter um novo tipo de alimento.
— De que sementes está
falando? Não estou entendendo nada.
— Vieram de cima, conforme
estava escrito.
— Escrito onde?
— Nos livros antigos. Tem
mais uma coisa Vina, em breve ensinarão nossos filhos.
— Meus filhos, serão
ensinados por mim!, esbravejou Vina.
— Você ainda vai entender.
As sementes foram plantadas,
a terra do vale era muito fértil. Germinaram e cobriram muitas áreas.
As produções de trigo, milho
e outros cereais foram ótimas. Tropo passou a todos, as formas de preparo dos alimentos,
e o povo se deliciou com as novas iguarias.
Restava ao Rei cumprir a
última instrução.
Mandou chamar Jasun. Este
vistoriava os improvisados silos quando foi avisado. Não demorou em atendê-lo.
— Quero falar com Sato, você
mesmo deverá formar uma comitiva e convidá-lo a vir me visitar. Se não quiser,
peça para permitir que vá até ele. Diga ser importante o que tenho para
mostrar.
Jasun foi até a nação
vizinha e convidou o Rei dos Nogos. Sato, depois de muito pensar, resolveu
aceitar o convite, dizendo:
— Fale a Tropo que estarei
lá dentro de seis dias. O Servidor voltou e deu o recado ao seu Rei.
Passados aqueles dias, Tropo
mandou preparar um verdadeiro banquete, só com os novos alimentos.
Recebeu festivamente o ex inimigo
que trouxera a esposa e vários auxiliares.
Estavam para iniciar a
refeição, quando Sato estranhando as coisas que via, esperava o anfitrião
começar. Este, percebendo, logo passou a comer e deu sinal aos da casa, o que
foi seguido pelos convidados. A medida que o Rei dos Nogos e seu grupo ingeriam
os alimentos, não deixavam de elogiar o que saboreavam.
Vina se entendera muito bem
com Tat e logo estava mostrando o casal de filhos e suas coisas. Nascia ali,
naquele momento uma união. A esposa de Sato também era mãe de um casal, quase
na mesma idade, ambas tiveram muito assunto.
Tropo, depois do farto
banquete, levou Sato com o grupo para conhecer os estoques daquela aldeia.
Quando voltaram, pediu ao então quase amigo para conversarem. Ambos sentaram,
um frente ao outro, junto a uma pequena mesa, o que lembrava a última vez que
se encontram. Difícil era distinguir a fisionomia de ambos, faces peludas e
cabelos longos, mesma altura, mesmo corpo, a única diferença era que o Rei de
Suma possuía cabelos castanhos.
— Sato, o convidei para vir
me visitar, justamente para que saboreasse a comida. Os alimentos são frutos de
sementes enviadas por um povo que vive fora daqui, doadas sob a condição de que
depois da colheita deveria distribuí-la para sua nação. Mandei escrever a maneira
de plantar, como colher e a forma de preparar os produtos. Também, como a safra
deve ser guardada. Quando voltar lhe entregarei as instruções. Não há
comparação com os cereais que produzíamos.
— Não sei o que dizer. Isto
para nós é a salvação. Mas, de onde é esse povo?
— Não sei muito bem como
explicar. Nosso mensageiro Corin desapareceu por algum tempo, de repente voltou
e me trouxe uma longa carta e as sementes foram deixadas no topo da serra
principal. Vieram do alto, do céu.
— Acredito Tropo, nunca vi
por aqui tais alimentos. De qualquer forma agradeço sua generosidade.
Aquela confraternização selara em definitivo a
paz entre os dois países.
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