O
CONTATO
Kleber realizava seu grande
desejo, participar de missões reais. Tivera a melhor classificação nos
treinamentos, mas eram simulações.
Seria o primeiro a pisar no
planeta, embora a poucos dias fora quem lançara o míssil de combate.
Vira quando as tropas, lá em
baixo caminhavam para o confronto, não podia ter o mínimo erro para não
destroçar um ou outro lado. A ordem era a de interromper a ação, se não visse
condição para o lançamento, voltar.
Agira no momento preciso,
acertara exatamente no alvo.
Agora seu trabalho, era
outro, colocar durante a escura noite, numa elevação, um posto avançado,
deixando os escolhidos Tobias e Chino como observadores em terra. Descarregaria
o material necessário e voltaria.
Os dois passageiros estavam
preocupados, seriam os únicos terrestres naquele mundo cujo povo não parecia
fazer outra coisa a não ser guerrear. Sentiam-se amedrontados, gostariam de
pertencer a um grupamento armando. Receberam apenas dois revolveres, assim
mesmo com a ordem de usá-los somente em caso extremo.
— Pensando bem, nossa
situação é difícil, comentou Chino, enquanto a nave cumpria metade da
trajetória.
— Recebemos ordens, temos de
cumpri-la. Tentaremos um contato amistoso, nosso papel será este, acrescentou
Tobias.
Kleber ouvia aqueles homens
e pensava:
— Vão descer no escuro e
estarão nele. Isto é um erro, ainda não conhecemos nada daqueles seres, poderão
atacá-los. Não acredito que este seja o momento certo para isto. Ainda temos androides
que funcionam, por que não os enviam? Tem coisas que não entendo. Sei que não
gostaria de estar no lugar deles.
Passado algum tempo a nave
penetrava as camadas estratosféricas e atingia a zona escura do planeta,
momento em que o piloto comentou com Tobias:
— Liguei o visor com
infravermelho, logo vamos chegar no local, veja a tela.
— Estamos tão longe e
podemos ver uma das vilas.
— É a amplificação.
Momentos depois, o brilhante
fogo dos propulsores começa a frear a nave, ao mesmo tempo em que risca os céus
de Vale Verde.
A nave para sobre a
montanha. Kleber solicita aos dois pegarem suas lanternas e seguí-lo. Queria
ser o primeiro a pisar no planeta, isto ele não deixaria para outro.
Aberta a escotilha, desceram
iluminando o platô, estavam finalmente em Marino.
Corin era muito jovem, seus pelos
eram ralos. Muito conhecido por todos, seu trabalho era o de entregar
mensagens. Não havia lugar que não conhecesse, passava a vida em contato com a
natureza. As vezes percorria longas distâncias para levar avisos dos habitantes
da aldeia, em troca de alimentação e de algumas moedas. Cumpria com fidelidade
as entregas, destemido, nada o intimidava.
Lasco era um pobre lavrador
que vivia com a esposa e cinco filhos pequenos. Com o fim da guerra queria
melhorar sua casa e plantar, precisava de ajuda, separou alguns trocados e um
pouco de alimento e entregou a Corin. Pediu que fosse chamar o irmão do outro
lado da montanha.
— Diga ao Tino que preparei
lugar para ele e a família, consegui um pouco de sementes.
O mensageiro não perdeu
tempo, ora a pé, ora sobre o animal, após mais de um dia chegou na casa do
irmão de Lasco e deu o recado, recebendo a resposta de que logo iriam para a
aldeia. Descansou algumas horas e depois retomou o caminho de volta.
Havia andado cerca de trinta
quilômetros, estava no alto da serra quando resolveu parar para o pernoite. O
local onde estava era plano, sem árvores. Não era a primeira vez que ficava
ali. Sentia-se no topo do mundo, podia ver todo o horizonte. Retirou agasalhos
e arreios do animal e o soltou, sabia que ficaria por perto, eram apegados um
ao outro. O frio da noite seria intenso, com certeza nevaria, assim fez uma
fogueira, retirou da sacola uma espécie de broa e uma botija. Após comer,
sorveu uns goles d’água, satisfeito, deitou-se, enrolou-se num grosso manto e
olhando as poucas estrelas do escuro céu, acabou adormecendo.
O grande barulho, a terra
tremendo fez Corin acordar num sobressalto, tentava enxergar mas a luz cegante
dos jatos que corroíam a terra o impedia de ver o que estava a frente. Há cerca
de duzentos metros estava acontecendo coisa que nunca imaginara, para ele
aquilo era doze muito forte, tremia da cabeça aos pés. Um medo apavorante
apossou-se dele. Com olhos arregalados, mantinha-se fixo observando o violento
fogo. De repente tudo parou, quando ia se tranquilizando, dois olhos muito
grandes e brilhantes se fixaram nele e foram chegando. Foi demais para o moço,
acabou desmaiando.
Jansen, acompanhando o
trabalho do astronauta, mantinha-se em permanente contato.
O áudio estava aberto quando
Kleber comunicou:
— Descemos num pequeno
plano, próximo a uma aldeia, o local é perfeito para uma base. Encontramos um
nativo acampado a uns duzentos metros, está desmaiado. O susto dele foi muito
grande quando nos aproximamos com os holofotes.
— Certo Kleber, leve o homem
para dentro da nave, não deixe que escape. Aguarde instruções, é provável que
mudemos a missão, mantenha o rádio ligado.
Jansen imediatamente
comunicou o fato ao Comandante.
Marcos, por sua vez, julgava
oportuno trazer o rapaz, antes porém pediu tempo para entrar em contato com a
Central.
Regis inteirado do fato,
opinou pelo cancelamento da missão e remoção do jovem para a cidade espacial.
A nave de reconhecimento
decolou, no caminho Corin abriu os olhos, viu um monte de coisas estranhas,
queria fugir mas estava preso numa cadeira. Olhava assustado para aqueles três
homens esquisitos, com muito custo soltou a voz e passou a gritar para
tirarem-no dali. Kleber tentou o gesto universal de pedir calma, mas não arriscou
a retirar as amarras. O jovem entendeu, pensou:
— Devo ter morrido, estão me
levando para a Terra Negra para pagar minhas faltas.
Dali em diante, ficou
quieto, se conformara com a sorte.
A nave entrou no sulco da
base e estacionou.
Atônito, sem nenhuma reação,
o rapaz se deixava levar, sentia o corpo leve, em sua cabeça estava no mundo
dos espíritos. Viu homens desamarrá-lo, tirar-lhe a roupa e o quarto cheio de
fumaça onde ficou flutuando.
Com as novas roupas que lhe
colocaram, não ficava muito diferente dos terrestres, a não ser pelos longos
cabelos e pela pelagem que envolvia as partes visíveis do corpo.
Estava livre, entrara num
lugar muito bonito, via “espíritos” em toda parte. Pensava:
— Eles perdem os pelos,
ficam brancos. Para onde me levam agora? Ah! Estão me mostrando uma porta, ...
abriram. Mostram uma cama, agora a cadeira. Mandaram eu sentar, eles não falam,
só mostram..., agora trouxeram um prato com coisas que parecem frutas, ...
fazem gestos que é para comer. Vou experimentar, ... é muito saborosa. Saíram,
fecharam a porta. Aqui deve ser o meu lugar, só tem uma coisa que não entendo,
sinto o meu corpo.
Assim, naquele ambiente que
lhe era totalmente estranho, Corin procurava decifrar o que acontecia. Sua
cultura era pobre, muito primitiva. Uma coisa pesava a seu favor, era
inteligente e logo perceberia a realidade.
Deitou-se na confortável
cama e um profundo sono lhe abateu. Quando acordou pensava ter tido um sonho,
mas viu que continuava no mesmo lugar. Sentindo as necessidades normais do ser
vivo, logo encontrou a porta de acesso ao sanitário. Não conhecia as peças
internas, mas não foi difícil perceber as finalidades.
Depois de aliviado, começou
a pensar diferente:
— Acho que aqui não é lugar
dos espíritos, imagina se espírito tem que urinar. Só pode ser outro povo que
possui coisas que nunca vi. Estou vivo e fui tirado de onde estava.
Na Roda, o sistema televisivo mostrou durante
todo aquele dia imagens do homem da superfície. Na reportagem o Comandante
Marcos pediu à comunidade evitar aproximação com o moço, para não inibi-lo,
completando que quando estivesse pronto, todos iriam ter oportunidade de
contatá-lo.
— — —
Na aldeia Vale Verde,
habituados com a presença de Corin, notaram sua ausência. Alguns que sabiam e
outros que precisavam dele foram até a casa do lavrador que o contratara. Lá
encontraram tanto Lasco quanto o irmão Tino, este último havia recebido a
mensagem há muitos dias, tanto que já estava trabalhando. Estranharam não ter
voltado para dar a resposta, confirmando mais ainda o sumiço do rapaz.
O grupo ia se retirando,
quando Tino comentou:
— Naquele dia que foi me
avisar, durante a noite perdi o sono e abri a janela. Vi então luzes muito
brilhantes na Serra, depois uma coisa soltando fogo saiu e foi para o alto, até
falei para meu irmão.
— É verdade, tem coisas que
a gente não entende.
— Precisamos ir até lá, as
vezes isto o machucou, disse uma das pessoas.
— Combinado, vamos até lá.
Sinto-me responsável, fui eu que o contratei, completou o lavrador.
Naquele mesmo dia, dez
homens subiram as encostas e chegaram até o local. Encontraram a vegetação
queimada e perto os pertences de Corin. Procuraram-no por toda parte, encontram
o animal, mas do jovem nem vestígio.
O estranho desaparecimento
do rapaz fomentou comentários por muito tempo, principalmente por ligarem o
fato às superstições.
Tropo parecia ter um sexto
sentido muito aguçado. A notícia do desaparecimento de Corin era para ele mais
uma peça nas coisas que iriam acontecer. Chegou a dizer para ninguém se
preocupar, que o moço voltaria, muito diferente, mas que aguardassem.
Como poderia saber?
Nem todos acreditavam, mas a
grande maioria repetia as palavras do Rei.
Até Vina se encabulou e
perguntou-lhe:
— Como pode afirmar uma
coisa dessas?
— Para você vou adiantar alguma
coisa. Li algumas histórias antigas, não entendia, agora começam a ter sentido.
Temos um ser superior que rege nossos destinos, estou aprendendo que somos
importantes para Ele. Sinto que alguma coisa grave está para acontecer, se
confiarmos Nele, receberemos ajuda.
— Você fala de uma forma que
me assusta.
Nisto, os filhos Jasp e
Kiria entraram barulhentos se achegando aos pais. Vina, segurando as mãos deles
saiu para um passeio.
Na cidade espacial, Corin
começava a entender porque o haviam levado para lá. Membros da faculdade que
conheciam linguística entraram em ação, o trabalho era ensinar o jovem a se
comunicar.
Sessenta dias após seu
rapto, já não apresentava nenhum receio dos terráqueos. Passara por exames
médicos, sua constituição física era idêntica a dos humanos, apenas o cérebro
possuía uma medida um pouco acima do normal.
Captava com facilidade os
ensinamentos, exceto visualizar o que era planeta ou entender mecanismos.
O grupo que coordenava os
trabalhos não tinha pressa. A permanência em órbita fora determinada, sem tempo
definido. Por outro lado a população não demonstrava interesse em descer,
poderiam ficar em volta de Marino por quinhentos anos ou mais, se necessário.
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